# memória
Cubos como casas, casas como cubos. Tabuleiros de ovos sem ovos. Estruturas modulares e tridimensionais, de madeira e de metal, em escada. Em escala (quase) humana.Por contraste com a unidade orgânica do ovo, que contém um embrião animal (invisível aos nossos olhos), os variados maquinismos de produção por que o ovo transita são construções engendradas (diga-se assim) artificialmente.Nesta instalação – que pode eventualmente ser interpretada como uma (hipótese de uma) narrativa do movimento e da invisibilidade – os mecanismos, vazios, parecem aludir a uma presença dos ovos a que (não) nos é permitido aceder. Daquele passado permanecem sons e luzes, audíveis e visíveis, sombras ou halos como memória da passagem (alada) das criaturas geradas ab ovo.
# “do fim para o princípio”
Assim como no centro da palavra (reiterada) que gera a ideia desta exposição contém em si mesmo uma promessa de movimento – ovoovo –, também a presente instalação parece reenviar, sala a sala, passo a passo, para o processo (contínuo) de criação (natural e humana).De facto, por um lado, a articulação (desencontrada no espaço) das várias peças instaladas permite pôr a nu o processo de criação avícola. Por outro, a dialogar com estas estruturas mecânicas, são expostos desenhos (a grafite) e exercícios gráficos que recorrem ao jogo visual com a palavra ovo.Do nascimento e da eclosão permanecem rastos (cascas) que contêm a memória do embrião e vestígios do voo. Ou, melhor, em caminho inverso – “do fim para o princípio” – do voo, iniciado, invisível, ao ovo, permanecem apenas fragmentos, única realidade material deste processo.Como se fosse impossível acompanhá-lo em tempo real ou interromper o devir criativo, a mão (a arte) representa o que na natureza muda (voa). Tal como o traço desenhado é único e irrepetível, assim cada recorte em cada casca de ovo é aleatório e diferente de qualquer outro. Talvez aqui se encontrem natureza e arte, no que têm de singular e original.
Diana Pimentel